sábado, 28 de março de 2009

Um pouco sobres os comunas camarada!!!

De forma geral, a maioria dos livros didáticos costuma atrelar o surgimento do comunismo em função da reflexão teórica apontada por Karl Marx e Friedrich Engels. Entretanto, essa idéia de que o comunismo seria fruto de uma mera reflexão de dois teóricos do século XIX pode ser vista sobre outro prisma. Basta compreendemos o comunismo enquanto experiência socialmente vivida e, ao mesmo tempo, buscarmos enxergar traços dessa mesma experiência na fala de outros pensadores.

O comunismo pode ser compreendido como certo tipo de ordenação social, política e econômica onde as desigualdades seriam sistematicamente abolidas. Por meio dessa premissa, a experiência comunista parte de um pressuposto comum onde a desigualdade social gera problemas que se desdobram em questões como a violência, a miséria e as guerras. A intenção de banir as diferenças entre os homens acaba fazendo com que muitos enxerguem o comunismo como uma utopia dificilmente alcançada.

Na Grécia Antiga, o filósofo Platão buscou arquitetar uma forma de governo ideal onde a propriedade privada e as famílias seriam extintas. O fim da família e da propriedade reforçaram um ideal de comunidade que colocaria em segundo plano os interesses individuais e familiares. A união sexual deveria ter caráter temporário e a criação dos filhos seria de responsabilidade do Estado. Sem abordar a questão do escravismo, o pensamento platônico não tece uma crítica total aos valores de sua época.

Durante a Idade Média, a crise do sistema feudal e o grande enriquecimento da Igreja impulsionaram a formação de movimentos que tentaram abolir as desigualdades. Inspirados por um discurso de forte traço religioso, algumas das heresias medievais não só criticavam as desigualdades de seu tempo. Dotados de uma tendência mais radical, alguns movimentos religiosos deste período defendiam a supressão da classe nobiliárquica e a revolta camponesa como mecanismos de justiça social.

No período de ascensão da burguesia mercantil, outros pensadores também se preocuparam em criticar os valores de seu tempo em favor de uma sociedade ideal. No século XVI, o filósofo britânico Thomas Morus redigiu a obra “Utopia”, lançou novas bases onde o comunismo seria vivido por meio de mecanismos que subordinassem a individualidade em prol do coletivismo. Contrariando uma tendência do pensamento renascentista (o individualismo), Morus buscou uma maior comunhão social.

No século seguinte, o advento da Revolução Inglesa foi visto como uma experiência histórica que deu brecha a práticas comunistas. Em meio às reivindicações da nascente burguesia britânica, trabalhadores urbanos e camponeses reivindicavam o fim das propriedades privadas e coletivização igualitária das riquezas. Nessa época, um grupo conhecido como “diggers” (do inglês, cavadores) plantava em lotes públicos e distribuía os alimentos colhidos entre a população inglesa.

O desenvolvimento da sociedade capitalista trouxe novas inspirações ao pensamento comunista. O auge dessas tentativas de explicação das desigualdades surgiu com os pressupostos do socialismo científico de Karl Marx e Friedrich Engels. Inspirados pela dialética hegeliana e uma interpretação histórica das sociedades, esse pensadores buscaram na realidade material a construção de um argumento que colocou no antagonismo das classes sociais as bases de transformação do mundo.

Dessa maneira, o socialismo lançou uma ousada proposta de transformação ao buscar na luta de classes e no materialismo histórico, meios racionais de mudança. Segundo o pensamento marxista, as desigualdades seriam suprimidas no momento em que as classes subordinadas tomassem o controle do Estado. Controlando esta instituição teriam a missão histórica de promover mudanças favoráveis ao fim das desigualdades sociais e econômicas.

Esse governo guiado pelo interesse dos trabalhadores, ao longo do tempo, reforçaria práticas e costumes em favor do comunismo. De acordo com o pensamento socialista, a real instituição do comunismo somente aconteceria no momento em que o Estado (compreendido como uma instituição de controle) fosse extinto em favor de uma sociedade na qual as riquezas fossem igualitariamente divididas a todos aqueles que contribuíssem com sua força de trabalho.

Por Rainer Sousa
Graduado em História
Equipe Brasil Escola

Frase do dia...Miguel Cervantes

"Não existe maior loucura no mundo do que um homem entrar no desespero"

sexta-feira, 20 de março de 2009

Presente não presente...

O Presente sem Passado nem Futuro
Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje - tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara -, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. 
O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto. 

Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego' 


Frase do dia...André Maurois



"A felicidade é uma flor que não se deve colher
 "

sexta-feira, 13 de março de 2009

Mas a quem pertence o amanhã?

A Racionalidade Irracional
Eu digo muitas vezes que o instinto serve melhor os animais do que a razão a nossa espécie. E o instinto serve melhor os animais porque é conservador, defende a vida. Se um animal come outro, come-o porque tem de comer, porque tem de viver; mas quando assistimos a cenas de lutas terríveis entre animais, o leão que persegue a gazela e que a morde e que a mata e que a devora, parece que o nosso coração sensível dirá «que coisa tão cruel». Não: quem se comporta com crueldade é o homem, não é o animal, aquilo não é crueldade; o animal não tortura, é o homem que tortura. Então o que eu critico é o comportamento do ser humano, um ser dotado de razão, razão disciplinadora, organizadora, mantenedora da vida, que deveria sê-lo e que não o é; o que eu critico é a facilidade com que o ser humano se corrompe, com que se torna maligno. 
Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpáticos, são adoráveis, mas deixemos que cresçam para sabermos quem realmente são. E quando crescem, sabemos que infelizmente muitas dessas inocentes crianças vão modificar-se. E por culpa de quê? É a sociedade a única responsável? Há questões de ordem hereditária? O que é que se passa dentro da cabeça das pessoas para serem uma coisa e passarem a ser outra? 
Uma sociedade que instituiu, como valores a perseguir, esses que nós sabemos, o lucro, o êxito, o triunfo sobre o outro e todas estas coisas, essa sociedade coloca as pessoas numa situação em que acabam por pensar (se é que o dizem e não se limitam a agir) que todos os meios são bons para se alcançar aquilo que se quer. 
Falámos muito ao longo destes últimos anos (e felizmente continuamos a falar) dos direitos humanos; simplesmente deixámos de falar de uma coisa muito simples, que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo. E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro, que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional. Isso, de facto, não posso entender, é uma das minhas grandes angústias. 

José Saramago, in 'Diálogos com José Saramago' 

Frase do dia...Antonio Porchia



"Perco o desejo do que procuro ao procurar o que desejo "

sexta-feira, 6 de março de 2009

Socialismo celestial

Lênin desce aos infernos

Depois de fazer a Revolução Russa, acabar com as diferenças de classes sociais e dedicar sua vida inteira ao comunismo, Lênin finalmente morre. Por ser ateu e ter perseguido os religiosos, termina sendo condenado ao inferno.

Ao chegar lá, descobre que a situação é pior que na Terra: os condenados são submetidos a sofrimentos incríveis, não há alimento para todos, os demônios são desorganizados, Satanás comporta-se como um rei absoluto - sem qualquer respeito por seus empregados ou pelas almas penadas que agüentam o suplício eterno.

Lênin, indignado, rebela-se contra a situação: organiza passeatas, faz protestos, cria sindicatos com diabos descontentes, incentiva rebeliões. Em pouco tempo, o inferno está de cabeça para baixo: ninguém respeita mais a autoridade de Satanás, os demônios pedem aumento de salário, as sessões de suplício ficam vazias, os encarregados de manter acesas as fornalhas fazem greve.

Satanás já não sabe o quer fazer: como seu reino pode continuar funcionando, se aquele rebelde está subvertendo todas as leis? Tenta um encontro com ele, mas Lênin, alegando não conversar com opressores, manda um recado através de um comitê popular, dizendo que não reconhece a autoridade do Chefe Supremo.

Desesperado, Satanás vai até o céu conversar com São Pedro.

- Vocês lembram aquele sujeito que fez a revolução russa? - diz Satanás.

- Lembramos muito bem - responde São Pedro. - Comunista. Odiava a religião.

- Ele é um bom homem - insiste Satanás. - Mesmo que tenha seus pecados, não merece o inferno; afinal, procurou lutar por um mundo mais justo! Na minha opinião, ele devia estar no céu.

São Pedro reflete algum tempo.

- Acho que você tem razão - diz finalmente. - Todos nós temos nossos pecados e eu mesmo cheguei a negar Cristo por três vezes. Mande ele para cá.

Louco de contentamento, Satanás volta para sua casa e envia Lênin direto para o céu. Em seguida, com mão de ferro e alguma violência, termina com os sindicatos de demônios, dissolve o comitê de almas descontentes, proíbe assembléias e manifestações de condenados.

O inferno volta a ser o famoso lugar dos tormentos que sempre assustou o homem. Louco de alegria, Satanás fica imaginando o que deve estar acontecendo no céu.

“Qualquer hora São Pedro vai estar batendo aqui, pedindo que Lênin retorne!”, ri consigo mesmo. “Aquele comunista deve ter transformado o paraíso em um lugar insuportável!”

O primeiro mês passa, um ano inteiro passa, e nenhuma notícia do céu. Morto de curiosidade, Satanás resolve ir até lá para ver o que está acontecendo.

Encontra São Pedro na porta do Paraíso.

- E aí, como vão as coisas? - pergunta.

- Muito bem - responde São Pedro.

- Mas está tudo mesmo em ordem?

- Claro! Por que não haveria de estar?

“Este cara deve estar fingindo”, pensa Satanás. “Vai querer me empurrar Lênin de volta”

- Escuta, São Pedro, aquele comunista que eu mandei, tem se comportado bem?

- Muito bem!

- Nenhuma anarquia?

- Pelo contrário. Os anjos são mais livres que nunca, as almas fazem o que bem desejam, os santos podem entrar e sair sem hora marcada.

- E Deus, não reclama deste excesso de liberdade?

São Pedro olha, com uma certa piedade, o pobre diabo a sua frente.

- Deus? Camarada, Deus não existe!

Frase do dia...Jean-Paul Sartre

"Detesto as vítimas quando elas respeitam os seus carrascos"